"Ou você é livre, ou você não é. Ou você é livre e a coisa é autêntica, real, viva, ou não é nada." (A humilhação, Philip Roth)

terça-feira, 3 de novembro de 2009

La Fiesta del Día de Todos los Santos

Ontem foi feriado na Bolivia, como no Brasil, no México (e não sei mais onde), era dia de homenagear os mortos. Mas há uma diferença incrível entre a maneira de fazer a homenagem no Brasil e na Bolivia.
Fui a festa no Cementerio General de La Paz. A festa começa no dia 01 de novembro ao meio dia, quando as almas dos mortos chegam para visitar seus parentes que estão vivos. As famílias se preparam para receber as "almas" fazendo as "mesas", que são oferendas com coisas que os falecidos/as gostavam. Coisas como pães, doces coloridos, bolachas, vinho, cerveja, coca-cola, chicha (uma bebida feita de maíz, um tipo de milho, muito popular na Bolivia), às vezes algum prato específico que o falecido/a mais gostava, as flores que mais gostavam e, claro, sua música preferida.
Ninguém chora de saudades, todos estão felizes porque tem a oportunidade de se reencontrar com seus entes queridos. São feitas rezas, visitas aos túmulos e estão todos envolvidos nas homenagens, inclusive as crianças.
No dia 2, ao meio dia, as almas voltam para o céu. Na hora de se despedir, ao meio dia, é celebrada uma missa na Igreja do Cementerio General de La Paz e, imagino, também nos cemitérios clandestinos que existem por todos os cantos... As pessoas vão a missa e aproveitam para colocar as oferendas nos túmulos, o que inclui tocar as músicas que o falecido/a gostava em frente ao seu túmulo. Isso, para um brasileiro, beira o surrealismo... Imagine as pessoas cantando, algumas dançando, num cemitério??!! Ninguém está triste, há um monte de crianças por todos os lados... as famílias aproveitam e fazem picnic dentro do cemitério e fora dos muros do cemitério a festa é ainda maior... MUITA GENTE, muitas bancas de comida e de comércio em geral... as ruas próximas ao cemitério parecem um grande mercado, nada lembra que é dia de finados.
Famílias inteiras rezam ao lado de outras que cantam por seus mortos e tudo, tudo, é muito colorido... as tradições católicas são mescladas com as tradições aymara em relação a morte.
Ao final, tive a impressão de que os bolivianos tem uma maneira muito saudável de lidar com a morte. A morte é mais que uma coisa natural, é um estado, que não afasta definitivamente aqueles que se amam e nem impede o contato entre os que se foram e seus parentes e amigos. Porque todos sabem que, pelo menos, uma vez por ano se reencontrarão e poderão privar uns da companhia dos outros. Inclusive se diz que receber as almas com lágrimas é ruim, porque, afinal, não se pode receber uma visita ou um hóspede com lágrimas, mas, sim, se deve recebe-los com alegria e júbilo. Isso me impressionou muito, em especial a presença de tantas crianças no cemitério e a tranquilidade com que todos lidam com a morte.
Domingo que vem, dia 08 de novembro, é o dia da Fiesta de Las Ñatitas, quando de fato chega ao fim o encontro dos vivos com os mortos. Neste dia as pessoas levam caveiras (crânios humanos de desconhecidos) que tem em suas casas para proteção para os cemitérios. No cemitério enfeitam as caveiras, lhes dão de beber e fumar. Não sei mais que isso. Mas garanto que domingo que vem estarei no cemitério novamente e depois escreverei contanto como é a festa. Se já me surpreendi com a festa de finados, imagino que vá me impressionar ainda mais... contarei tudo na segunda, dia 09.

Mi cumple en La Paz

Como já disse aqui, Helô voltou para La Paz. A volta de Heloisa foi uma sorte!! É muito bom poder discutir as coisas com alguém que vem do mesmo lugar que nós, ou seja, que tem as mesmas referências e uma formação semelhante. Sem contar o fato de que há coisas que só se pode discutir em português... rs ou seja, ter uma pesquisadora brasileira como interlocutora, neste momento, é mais que bom, é ótimo!!!
Bom, Helô está dividindo o apê comigo e Christelle. Nós as três nos damos super bem e nos divertimos muito juntas. Até quarta passada Gabriela, minha irmã, e Juliana, uma amiga, estiveram aqui em La Paz, hospedadas em nossa casa. Bom, a confusão era tanta, principalmente porque as gurias não falam espanhol, que, num dado momento, Chris escreveu no facebook: "La Paz: territorio brasileño en Bolivia?" Pobre... rs mas é fato que as gurias e ela se comunicaram, até conversas tiveram... e a Chris adora estar com "sus brasileños", como ela diz... rs
A Gabi veio me visitar e aproveitou para fazer com que a viagem coincidisse com meu aniversário, o que foi ótimo!!
Mas genial mesmo foi a festa surpresa que a Helô e a Chris organizaram para mim com a ajuda da Gabi. Eu não desconfiei de nada e não facilitei em nada a vida delas... porque no sábado, dia 24, dia em que elas organizaram a festa, ninguém conseguiu me tirar de casa... rs Eu tava com começo de gripe, o dia estava chuvoso e eu tinha uma preguiça monstra de sair... as pobres das gurias tiveram super pouco tempo para organizar tudo e, enquanto elas corriam por La Paz, a Gabi quase dava piruetas dentro de casa para me despistar... rsrsrs Mas deu tudo certo e elas conseguiram me fazer várias surpresas!! rsrs
Os amigos vieram, comemos, bebemos e, claro, bailamos!!! Foi divertidíssimo!! Me senti tão acarinhada como se estivesse em SP com todos os meus amigos queridos... pude ter a prova cabal de que, sim, já tenho bons amigos em La Paz!!
Nunca vou esquecer mi primer cumple paceño... Ojalá tenga yo la oportunidad de comenmorar otros en La Paz!!!

Wallerstein e tudo o mais que possa ver e ouvir

O historiador I. Wallerstein esteve em La Paz entre 13 e 15 de outubro apresentando conferências por ocasião do IV Seminario Pensando el Mundo desde Bolivia. Fui às conferências que depois foram comentadas por García Linera (1° dia), Luis Tapia (2° dia) e Raúl Prada (3° dia). As conferências foram interessantes, apesar de Wallerstein misturar espanhol com inglês, francês e italiano... às vezes foi difícil compreendê-lo, mas depois que descobri que para muitos bolivianos também foi difícil fiquei tranquila. Não foi por minhas limitações na língua de Cervantes que tive dificuldades, mas porque o velhinho não colaborava mesmo... rs
Semana passada, de 26 a 28 de outubro, aconteceu o Seminario Internacional "Bolivia Post-Constituyente: tierra, territorio y autonomías indígenas", organizado pela Fundación Tierra, em La Paz. O seminário foi bastante interessante e abordou os temas mais polêmicos na Bolivia hoje.
Além de eventos acadêmicos, tenho conversado com muita gente. Pesquisadores, acadêmicos ou não, tem me ajudado muitíssimo. Elena Apilánez, a espanhola mais latino americana do mundo, que fala português e viveu no Brasil, tem sido, além de uma boa amiga, uma interlocutora incrível. Além dela, Luz Castillo, do Museo Nacional de Etnografia y Folklore - MUSEF, que foi uma indicação de Ana Sanchez, também tem sido uma interlocutora importante. Luz conseguiu para mim uma entrevista com o diretor do MUSEF, o senhor Ramiro Molina. O senhor Molina é antropólogo e conversou quase três horas comigo. Me deu um monte de sugestões e se dispôs a me ajudar no que eu precisar. Depois desta conversa também consegui sua aprovação para me tornar pesquisadora associada do MUSEF. O que é muito bom, porque o museu é uma instituição muito respeitada e reconhecidamente séria, portanto, essa associação provavelmente me abrirá muitas portas!! As coisas continuam caminhando bem para mim e para o meu trabalho. Ojalá todo pase de esa manera hasta que yo vuelva para São Paulo!!