"Ou você é livre, ou você não é. Ou você é livre e a coisa é autêntica, real, viva, ou não é nada." (A humilhação, Philip Roth)

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Quando La Paz me levou ao Cairo

Logo que cheguei a La Paz fiquei hospedada na casa de Simona e Lorenza. Uma linda casa em Sopocachi, com quintal, janelas grandes e uma cozinha enorme (como aliás, eram todos os cômodos). Mais que grande, a casa era acolhedora e tinha buena onda, como seus habitantes. Quando cheguei estavam também hospedados lá, Ramiro, um médico espanhol, e Amal, uma cineasta egípcia, amiga de Simona.
Fui muito bem recebida por todos e minha primeira aventura paceña (que contei em um dos primeiros posts do blog) foi com Amal, que me levou até um bar em Sopocachi. Amal estava em La Paz por causa de um festival de cinema, ela apresentou um de seus filmes e participou de debates no festival. Depois aproveitou para viajar e conhecer um pouco da Bolívia. Quando cheguei à La Paz, ela voltava de Uyuni. Como já estava em La Paz há alguns dias e, nesse momento, já estava sem compromissos, foi Amal quem me levou para conhecer o centro de La Paz e com ela fui pela primeira vez à Livraria Plural (lugar onde voltei nem sei quantas vezes no tempo em que vivi na cidade...). A primeira salteña paceña que comi foi na companhia dela.
Caminhavamos por La Paz e falavamos de tudo, da vida e de nossos países. Amal viveu muitos anos na Espanha, fala espanhol com sotaque madrileño. Amal me fez querer conhecer o Cairo e o Egito. Eu não sabia muito do Egito, para ser honesta, não sabia nada... ela sabia um pouco sobre o Brasil, em especial sabia de Lula. Em nossas conversas, pela primeira vez, ouvi o nome de Hosni Mubarak. Amal me contou que ele estava no poder há quase 30 anos, que o Egito vive uma ditadura e que o país passava por muitos problemas, como a falta de liberdade. Me ouvindo falar sobre São Paulo, do caos, da pobreza e dos problemas que a cidade enfrenta, e do quanto amo a cidade, como não consigo me imaginar vivendo em outra cidade brasileira; ela me falou sobre o Cairo, disse que entendia minha relação com a cidade e achava que minha relação com São Paulo era como a dela com a cidade do Cairo. Horror, às vezes ódio, mas amor profundo. Amal me contou que decidiu voltar para o Cairo porque não conseguia mais viver longe de lá, decidiu que era lá que queria viver, apesar de tudo...
Nos despedimos em La Paz em agosto de 2009. Ela me convidando para ir ao Cairo e eu a convidando para vir a São Paulo. Ficamos amigas em poucos dias, quatro talvez... nem me lembro mais exatamente quantos dias passamos juntas... Me lembro das nossas conversas, do som da risada de Amal, que tem um sorriso que enche um salão... Ano passado, 2010, ela me enviou textos sobre ElBaradei e Mubarak. Foi por ela que soube das mobilizações contra a ditadura de Mubarak. Quando olho as fotos dos protestantes no Cairo fico imaginando onde ela está... Se está nas ruas, se está bem, se foi presa... Ainda não tive notícias dela. Espero que esteja bem. Logo que ela anunciou a "Sexta-feira de fúria" no facebook, pouco antes de a internet deixar de funcionar no Egito, escrevi um e-mail para ela. Nesse e-mail enviei a música "Tanto mar", de Chico Buarque. Nada mais me ocorreu, apenas enviar uma música que fala de uma Revolução associada à flores e bem sucedida. Que o Egito mude, que Amal não mude. Que Amal esteja sorrindo em algum lugar do Cairo. Só o que espero é ter boas notícias dela e de seu país o mais rápido possível.

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