"Ou você é livre, ou você não é. Ou você é livre e a coisa é autêntica, real, viva, ou não é nada." (A humilhação, Philip Roth)

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Um encontro literário, porque só é possível amar Elias Canetti

A primeira vez que ouvi falar em Elias Canetti foi em uma aula de Omar Ribeiro Thomaz na Sociais, nos idos de 1997 (acho...). Era uma aula sobre nação e nacionalismo e Omar citou o livro A língua absolvida, para falar sobre os Balcãs. Só muito tempo depois soube que este era o título do primeiro volume da autobiografia de Canetti (que tem 3 volumes). Na época fiquei interessada pelo livro e pelo autor, mas, como acho que nem sempre lemos o que queremos, isto é, os livros nos encontram em fases adequadas da vida, alguns não adianta tentarmos, só leremos quando estivermos "prontos", acabei não indo atrás do livro e me deixei esperar que o "encontro" acontecesse. E ele aconteceu... Primeiro com As vozes de Marrakech, livro de Canetti publicado no Brasil pela Cosac&Naify. Estava perambulando pela feira de livros da USP, em um novembro de 2007 ou 2008, e, de repente, na banca da Cosac&Naify, dei de cara com o nome de Canetti. Comprei o livro sem saber sobre o que se tratava. Foi amor do mais puro o que sobreveio com a leitura. As vozes é um livro de viagem, Canetti conta sua primeira ida à Marrakech. Gostei tanto, mas tanto, que dei um jeito de citar o livro na minha qualificação. Citei mesmo, não é epígrafe, é citação. Sabe aqueles livros que te fazem ser melhor? Pois é... depois de ler este livro já o presenteei a não sei quantos amigos... tanto que nem tenho mais o meu volume... não me lembro a quem eu dei, mas certamente foi para alguém MUITO querido. No Natal passado comprei mais dois volumes e presenteei a duas amigas, assim divido com o mundo a maravilha que é ler este livro. No dia 26 de dezembro fui à Livraria Cultura e decidi que era hora de ler A língua absolvida... Cheguei lá e comprei os 3 volumes, edição com preço amigo, da Companhia de Bolso, enfim, comprei. E, novamente, a felicidade se fez... Li A língua absolvida em menos de uma semana, não conseguia parar de ler! Aí veio Uma luz em meu ouvido, o segundo volume. Que li enquanto estive de férias no Rio. Agora estou lendo O jogo dos olhos, o terceiro e último volume da autobiografia. Não estou lendo rápido, não consigo!! Não quero que acabe... sabe quando a gente começa a economizar um livro? Pois é, estou fazendo isso... Leio poucas páginas por dia, me delicio com a escrita de Canetti, com o modo como ele descreve pessoas e o tempo em que viveu, com como ele conta sua trajetória intelectual. Pura maravilha!! O modo como Canetti conta episódios de sua vida e seus percursos intelectuais, como se tornou escritor, o mundo em que vivia [primeiro a Bulgária, depois a Inglaterra, a Suíça, a Áustria, a Alemanha, a Áustria de novo (pelo menos até o ponto do livro em que me encontro)], como era a Europa em sua percepção, o que foi a Primeira Guerra, o pânico de outra guerra mundial, a explosão da arte em Viena... Enfim, literatura da melhor qualidade, escrita por um homem sensível e interessante.
Costumo ter encontros bombásticos com autores... foi assim com Tolstói, Érico Veríssimo, Roth, Cortázar, para mencionar os mais fortes e mais recentes. Definitivamente, Canetti.
Gostei, em especial, de duas passagens em Uma luz em meu ouvido. A primeira diz: "O respeito pelas pessoas começa por não ignorarmos suas palavras." (pg. 219) Por mais que discordemos delas... A outra diz: "Eu me inclino perante a memória, perante a memória de qualquer pessoa. Quero deixá-la intacta, pois ela pertence ao ser humano que existe para ser livre. Não oculto minha repugnância por aqueles que se permitem submetê-la a operações cirúrgicas, até que ela se assemelhe à memória de todos os demais. Que operem o nariz, os lábios, as orelhas, a pele e os cabelos, o quanto quiserem operar; que implantem olhos de outra cor, se tiver que ser assim; também corações estranhos, que pulsem por mais um ano; que apalpem tudo, aparem, alisem, igualem, mas que deixem a memória em paz."(pg. 304) Só é possível amar Canetti e sua maneira franca e linda de descrever lugares, pessoas e expressar seus sentimentos. Queria ser capaz de me expressar sempre assim, franca e lindamente.

P.S.: Quando terminar O jogo dos olhos faltará (entre outros livros do autor) Auto-de-fé (também publicado pela Cosac&Naify), o grande livro de Canetti. Sabendo como este livro foi escrito, não sei se me deixarei esperar pelo "encontro" ou se vou correr em direção a ele... a ver... depois eu conto.

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